O título (acima) do romance universal do russo Leon Tolstoi pode ser exagerado para a situação de exacerbação que vivemos estes dias no Brasil. Pode, e é.
Mas me sirvo da paráfrase, do quase absurdo, do absolutamente indesejável, para reforçar aquilo de que o país mais carece, a paz. Ou seja, a paciência dos que perderam a Presidência, e a sabedoria dos que agora a assumem. Abstenho-me de entrar no mérito do impeachment ou do não-impeachment. O que quero é realçar a tese.
Certamente que qualquer impasse abriga dois lados, duas razões, duas convergências. A dialética e o bom senso estão a sinalizar que ambos se isentem dos radicalismos. O curso da História de todos os países, aí incluindo o Brasil, exibiu sempre uma verdade: as perdas foram maiores que ganhos, em meio ao alarido suicida do embate mercurial de grupos que se opõem.
O corpo a corpo, a intromissão na integridade do indivíduo, de um que seja, provoca a perversão da paz, no que ela abriga de mais elementar e a ser curatelado por todos.
Fala-se aqui ou acolá que movimentos sociais sairão às ruas e aos campos para protestar e inviabilizar o novo Presidente. Comenta-se daqui e dali que o governo recém-empossado se armará de todos os meios para assegurar sua integridade. Uma guerra fratricida pode se esboçar.
Um dos melhores e mais sábios filhos desta nossa terra de vocação pacífica, o mestre Darcy Ribeiro, afirmou certa vez – e eu ouvi – que o enfrentamento físico por ideais era a fogueira dentro da qual crepitavam a burrice, a falta de razão, o desterro da possibilidade de união, mesmo futura. A guerra é a aberração. A paz, seu contrário.
Darcy liberava seu pensamento em frase desabrida, quase canônica: “os que se enfrentam como dragões da carochinha, projetando labaredas de fogo pelas ventas, são uns cagões. E uns desavisados do perigo e da merda que podem provocar.”
Tudo isso vem a propósito dos murmúrios que se entreouvem nas veredas do Governo e da Oposição. Esta, rugindo incendiar o país, paralisando-o e o inviabilizando. Aquele, vociferando uma defesa com forças armadas, policiais e até Exército…
Meu Deus, eu já vi este filme. De conseqüências trágicas para ambos os lados. O que necessariamente sugere – ou antes, obriga – um esfriamento imediato de reações intempestivas.
Afinal, mesmo na exaltação do momento de perda, mesmo na euforia da jactância do ganho, os contendores devem baixar a crista. E recolher seus esporões.
Em briga de galos ambos saem gravemente feridos. E a rinha, ensangüentada jaz, estéril e muito mais empobrecida. Só ganham os que apostam nos brigões. São eles precisamente os exploradores do povo, os sem-comiseração, os sanguessugas.
13 de maior de 2016
Ricardo Cravo Albin
Presidente do Instituto
Cultural Cravo Albin