“Vejo com algum espanto que nenhuma das datas nacionais pode unir mais o país que a Copa do Mundo.” Ariano Suassuna, em palestra no MRE-Rio em 2010.
De fato, a frase aí acima do Mestre Suassuna, emitida a meu lado ao apresenta-lo para multidão de mais de mil pessoas ao redor do lago do Itamaraty a pedido do Embaixador Jerônimo Moscardo, então presidente da Fundação Alexandre de Gusmão, foi complementada com um muxoxo – “Pena que não haja Copa a cada ano para lubrificarmos com frequência mais pontual a união nacional.”
Sem dúvida, a pátria de chuteiras nas copas sempre representou a transcendência da unidade de duzentos e trinta milhões de brasileiros dentro de um país continental como o nosso.
Gilberto Freire declarou-se incomodado porque só o futebol seria capaz de tal proeza, jamais as letras, o teatro, a cultura. Ao que Vinicius retrucou com desassombro – “a pátria de chuteiras nos pés é muito melhor que a pátria das armas nas mãos.”
Não à toa, portanto, o Brasil é o único pentacampeão mundial, e também o único a participar de 22 copas. Orgulho ou vergonha? Puro, puríssimo orgulho. Nesses dias já passados e os que se sucederão de imediato, mais que nunca devemos torcer pela seleção canarinho. E torcer para que tenhamos nos campos do Catar um bom futebol. Um festival de gols, de vitórias poderá provocar o milagre desejado. É só ele (o time verde e amarelo) que pode agregar um país partido ao meio pelo radicalismo de eleições por vezes fraticidas, que deixaram marcas indesejadas na sociedade brasileira.
Até hoje o sensível tecido social ainda se estremece e muitos ânimos continuam malignamente crispados. Amigos, ou casais, ou até mesmo vizinhos estão a se estranhar só porque divergem em quais candidatos ou partidos depositaram os votos para presidente. Só porque não ganharam, alguns (cada vez mais isolados) destilam discórdia e exibem desafios insensatos. Ainda existem no país esbirros golpistas, como algumas estradas sendo criminosamente bloqueadas. Ou mesmo os atos delirantes de grupetos frente a alguns quartéis exigindo golpe militar. Uma afronta à Constituição vigente. E gravíssimo insulto ao Exército de Caxias. A torcida tradicional da seleção foi desmobilizada pela chegada do verão e pela proximidade das eleições, que se apropriaram de símbolos e cores nacionais, o nosso verde-amarelo. O que pude comprovar com indisfarçada melancolia foi que ruas, prédios e casas, antes vestidos de verde-amarelo ficaram nus e sem qualquer cor. São pouquíssimas, conto até nos dedos, as que exibem a opulência das cores do Brasil, o canarinho que sempre nos uniu por décadas. Agora apropriadas por facções políticas radicais.
A partir de hoje, a seleção classificada para as oitavas de final, mesmo com o jogo não arrebatador contra a Suíça (um tanto morno para meu gosto), cumprirá ou deve cumprir o destino que se espera dela. Este é o país que nos pertence a todos e sempre deverá ficar unido para mergulhar de cabeça no futuro, que já desponta à nossa frente. Nossas cores nacionais não foram, nem jamais serão sequestradas por facções político-partidárias. Vamos sim, encerrar todas divergências e curar algumas fraturas que eventualmente ficaram expostas.
Desse modo, o hexa se aproximará, as bandeiras tremularão e o povo voltará a ser feliz. Como sempre desejou.
Nota de Repúdio: Horrorizado com as agressões a Gil e Flora, que foram prestigiar a estreia da seleção brasileira, em estádio no Catar, venho não só empenhar todo meu amor e admiração ao enorme brasileiro, quanto meu repúdio às grosserias e ofensas que uma extrema direita débil mental pode perpetrar. Logo Gil, cuja cor e grandeza rimam com o Brasil. Meu Deus, onde esses radicais vão parar? Urge silenciá-los. Viva Gil!
Ricardo Cravo Albin