Em recente reunião de escritores e intelectuais, fiquei muito espantado, e simultaneamente gratificado, quando a conversa derivou para observações sobre a arte e os prazeres das bebidas, em especial a nossa cachaça. Ora, em um salão em que se respiravam livros e artimanhas do espírito, o assunto veio mesmo a calhar. Até pelo insólito do papo. Insólito e original, eu logo deduziria. Além de puramente verdadeiro, e até necessário.
A cachaça é agora um produto de forte apelo mundial, no mesmo patamar de congêneres como tequila, rum, eau-de-vie e poucas outras.
Que a nossa brasileiríssima cachaça e seu derivado mais imediato, a caipirinha, são produtos que estão na mente, no coração e, sobretudo, na boca dos brasileiros, sempre eu soube.
Ou seja, a cachaça ejeta-se de sombrio passado de escárnio para alçar-se a uma bebida premium, de acolhimento universal.
Há que se comparar a antiga “marvada”, ou “caninha”, a um ativo cultural do Brasil, além de commodity em ascensão.
O Estado do Rio produz o que há de melhor no gênero. Aliás, muito recentemente soube de projeto irradiador: o governo fluminense pretende dar musculatura aos produtores locais de cachaças, incentivando-lhes as exportações. E, oh! maravilha, viabilizando a idéia de culturalizar-se cada vez mais o “preciso líquido” com um possível Museu da Cachaça. Cá no Rio.
Eu anotaria que ela está a caminho de se ombrear, como objeto de desejo, à imbatível luminosidade da nossa música popular, que, como sabemos, talvez seja o principal item artístico do Brasil no exterior. Na cachaça, o paladar aguça e faz aflorar o sabor, tal como o uísque ou o conhaque.
Mas há – e é importante que se observe – absoluta necessidade de investirmos em campanhas publicitárias destinadas à sua maior expansão, já que a seqüência prioritária, a caipirinha, triunfa entre os drinques mais solicitados do planeta, como o Cuba Libre ou o Dry Martini.
A falta de auto-estima e o histórico preconceito não automatizam o que deveria ser tão natural quanto obrigatório. Ou seja, que, em cada frigobar de hotel, estivessem presentes garrafinhas da mais fina aguardente. Bem como em todos os bares do Brasil, ao lado de garrafas de uísque.
Sonho ou patriotada? Certamente que não. Afinal a bebida típica do país porta agora a sobriedade (com trocadilho, por favor) da cultura das gentes brasileiras.
7 de agosto de 2015
Ricardo Cravo Albin
Presidente do Instituto
Cultural Cravo Albin