Quando uma convergência de notícias ruins e um amontoado cavernoso de dados negativos pairam por nosso “Lindo Pendão da Esperança, Símbolo Augusto da Paz”, eu começo a tremer.
E não só me ponho em tremores: um vômito seco vindo, sei lá, das profundezas da alma, parece subir por minha garganta. E não sai pela boca, mas se esparrama pelo rosto, pela pele, pela cabeça. Uma gosma invisível me faz arder de indignação, de inconformismo, de perplexidade.
Nestes últimos dias, o mesmo sintoma deste mal estar físico-cívico (com rima proposital) me abate sem piedade.
Quase ao final da semana, no exato momento em que a temerária viagem de Temer aportou a Oslo, na Noruega, o governo de lá expediu nota sobre o cancelamento de três centenas de milhões de dólares para ajudar tanto a manter a floresta Amazônica, quanto a fornecer meios aos povos indígenas para se autopreservarem. Mal acreditei: o governo norueguês estava cortando pela metade o gesto inestimável de boa vontade ao Brasil. E exclusivamente por nossa culpa. A vergonha se potencializou por duas ou três razões, de imediato tornadas claras como água, ao menos para mim.
A primeira, porque o anúncio do NÃO ao Brasil foi emitido com a presença de Temer em visita de estado ao país-anfritião. A segunda, vergonha ainda maior, porque o “Verde Pendão da Esperança” teria descumprido o que firmara em convênio internacional. Ou seja, além do vexame, o “Símbolo Augusto da Paz” infligiu o ultraje à Grande Floresta, reserva mundial de sustentabilidade do planeta, e (o pior) impôs desapiedadamente o prejuízo e a falta de comiseração aos povos indígenas, expulsos do “nosso Pavilhão da Justiça e do Amor, nos momentos de festa e de dor”.
Bem, não bastasse a quase desonra causada pela frieza com o que o presidente de baixa popularidade foi tratado pela Rússia e pela Noruega, a situação política por aqui provocava incêndios sucessivos, condenando cada um dos últimos dez dias à labaredas de perplexidades e de desgostos.
E para que os leitores dêem razão aos meus frêmitos, provocados pelos vômitos deste “peito juvenil, que não recebe o afeto que se encerra, e que não rima com a amada terra do Brasil”, também feriu meu coração um balancete publicado pela imprensa. Os números davam conta dos quase 1,5 bilhão de dólares gastos nos últimos 20 anos para recuperar nossa desvalida baía da Guanabara. Para o dissabor da cidadania carioca, sequer 20% dessa dinheirama foram transformados em minguados benefícios. Quase nada…
Em resumo, eu, que ia hoje falar nesta página dos centenários de gente que vale muitíssimo à pena, como Antonio Callado, Celso Cunha ou Ariano Suassuna, perpetrei a crueldade comigo mesmo de falar das vergonhas e dos malfeitos de dirigentes impublicáveis.
Uma trágica convergência de acontecimentos neste “Áureo Pendão da … Desesperança”.
Ricardo Cravo Albin
Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin