Quase sempre sou consultado sobre o que fazer em cultura quando mudam os dirigentes do Rio. Desta vez, insisti com os interlocutores do novo Governo sobre focar-se em órgão cultural que não pertence à burocracia estadual, a Academia Brasileira de Letras, cuja excelência a torna a mais febril dentre todas as casas de credibilidade intelectual do Rio.
Fico à vontade para aferir tal recomendação porque sempre a frequento, assistindo à variedade interessantíssima de palestras e ciclos. Mas não só por isso. Senão também pela seriedade de seus integrantes, intelectuais admitidos à Casa de Machado de Assis por disputadíssimas eleições. Os 40 acadêmicos exercem uma gestão adequada e democrática. Não sem razão são conhecidos como imortais, talvez uma homenagem a que o Brasil se afeiçoou pela exemplaridade de seu corpo de integrantes. Seria, por que não?, a idealização da Republica perfeita dos antigos filósofos gregos, ou seja, cidadãos de alta respeitabilidade a gerir o Senado.
De fato, acho que existe uma certa atmosfera benfazeja entre os pares da ABL , bem como o “Senado” que os abriga, o encantador Petit Trianon, raríssimo exemplar arquitetônico da exposição de 1922 (o outro prédio restante, é o do Museu da Imagem e do Som), destruída despudoradamente pela falta de cultura e de visão histórica dos prefeitos da cidade.
Nestes últimos anos a Casa de Machado de Assis, criada nos moldes da Academia Francesa, transformou-se em febril laboratório de ações culturais. Que não cuida apenas de letras, mas avança destemidamente por todos os desvãos do conhecimento humano, além de seminários, e até concertos.
Aquela figura caricatural de velhinhos apenas tomando chá, e esgrimindo teses pouco uteis ou “literaturice”, é coisa do passado.
Hoje a contemporaneidade ilumina o que chamo de nosso senado cultural. Os 40 “senadores” contribuem para um país mais civilizado, mais culto e mais bem informado.
Conclui minha indicação da ABL ao novo governo não porque a academia dela necessite. E nem está à míngua. Mas simplesmente porque a crise de país fez minguar as verbas de seus alugueis. Passando por dificuldade, então, estariam os bigodes do velho Machado? Sim, embora moderadas. Afinal, a crise em que o país se debate nesses últimos anos atingiu duramente as receitas que lhe pertencem e que chegavam dos alugueis do prédio ao lado, o monumental edifício Austregésilo Athayde. Uma injeção de recursos extras por agora alimentaria novos projetos, que determinariam novas ações, novas iniciativas, novos prêmios. Isso tudo faria a Casa regurgitar mais uma vez. As brilhantes 40 cabeças que lá tomam assento se estimulariam a criar novos projetos, debates, provocações. Nem tenho dúvida de que a doação de recursos à Academia não seria pregar prego sem estopas. Fiquem certos de que a ABL “fará a hora, não espera acontecer”.
Ricardo Cravo Albin
Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin