Não, não é obrigação de entidades privadas oferecerem cultura, palestras e/ou recitais de graça. Obrigação, sim, têm as instituições públicas. Afinal, o povo está aí mesmo para isso. Sôfrego para consumir mais cultura, mas cada vez com menos dinheiro no bolso.
Há poucos dias, fiquei comovido quando, ao chegar pelas 12 horas à Academia Brasileira de Letras, deparei-me com uma fila quilométrica. Pois bem, aquele público ali estava para ver a cantora Alcione. E não só para ouvi-la cantar, senão também para saber sobre sua vida e suas buscas dentro das raízes culturais.
Aliás, a Marron fez apresentação arrebatadora, comprovando-lhe a força do espírito e a voz exuberante.
E por que a Academia de Letras diversifica suas reflexões, permitindo e provocando a proximidade do povo?
Certamente porque os acadêmicos, liderados hoje pela escritora Ana Maria Machado, abrem os salões, que seriam apenas literários, para o Brasil profundo e vário. Ou seja, a ABL, tal como a Academia Francesa, abre-se para a diversidade da arte. A tal ponto que elegeu para seus quadros um cineasta, Nelson Pereira dos Santos, e um cirurgião, Ivo Pitanguy. Agora, alem de desenvolver um calendário extenso sobre cultura acadêmica, abriga um ciclo de reverências aos vultos mais significativos da musica popular, ponteando-se musica com informações sobre o artista e todo seu conjunto de inquietações estéticas. Ou seja, ouve-se e se aprende.
Ora, essa trama de eventos poderia até ser paga, porque a ABL é uma instituição particular e que não vive às tetas do Estado. Tudo lá é grátis e aberto ao público. Qualquer público, sem o ranço de ideias mofadas.
Arriscaria a dizer, para concluir, que a Academia jogou embaixo do tapete a surrada imagem de velhinhos caricaturais a tomarem chá. Qual o que! Os acadêmicos hoje acertam o passo com a modernidade de gestão e com o atrevimento de se despojarem de preconceitos.
Ricardo Cravo Albin
Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin