Conheça agora, depois do Lundu, outro gênero inicial da MPB: a Modinha.
Pelo final do séc. XVIII, outro tocador de viola, o poeta carioca Domingos Caldas Barbosa, deixou o Rio e foi para Portugal. Logo se tornou conhecido como intérprete de modinhas e lundus.
Caldas Barbosa é considerado por todos como o responsável pela fixação do gênero modinha e também do lundu na Lisboa da segunda metade do século XVIII. Em 1790, funda, juntamente com outros poetas (dentre os quais Curvo Semedo e Bocage), a Nova Arcádia de Lisboa. Adota o pseudônimo de Lereno Selinuntino, que usa para dar título à sua coleção de poemas, sobre os quais compôs modinhas e lundus: a Viola de Lereno (Publicados postumamente: Lisboa, vol. 1, 1798; vol. 2, 1826). Segundo Mozart de Araújo, apesar de todos os poemas da coleção terem sido musicados, somente uma das obras nos chegou com melodia: Ora, a Deos Senhora Ulina. A modinha está publicada nas páginas 98 e 99 do livro A modinha e o lundu no século XVIII, deste autor. Já Mário de Andrade afirmou o seguinte em Modinhas imperiais: “a proveniência erudita européia das modinhas é incontestável”. Hoje, muitos estudiosos consideram tal suposição incorreta, justamente por levarem em conta a vida e a obra de Caldas Barbosa. Segundo Tinhorão, em sua Pequena história da música popular brasileira 2, todos os contatos do compositor “terão sido com mestiços, negros, pândegos em geral e tocadores de viola, e nunca com mestres de música eruditos”. Assim sendo, a importância do compositor mestiço se fez no trabalho de transpor a distância entre a cultura popular e a cultura erudita, levando para os salões aristocráticos o produto artístico popular da colônia do além-mar: a Modinha brasileira.
A modinha foi o primeiro gênero popular brasileiro a ser divulgado com sucesso fora do país, há 250 anos. Caldas Barbosa, para desespero dos eruditos poetas portugueses (Bocage, Nicolau, Tolentino, Filinto Elísio e outros), era uma verdadeira coqueluche nos saraus da corte, com suas modinhas e lundus. Depois dele, praticamente todos os poetas românticos do Brasil tiveram seus versos musicados: Gonçalves Dias, Casimiro de Abreu, Castro Alves e outros. Até os modernos não escaparam da moda da modinha. Manuel Bandeira, Drummond e Mário de Andrade também forneceram poemas aproveitados pelos músicos. Chico Buarque, Vinícius de Morais, Juca Chaves, Baden Powell e muitos outros compositores de nossos dias fizeram modinhas. Ao finalizar o século XX, entre as canções escolhidas como as 10 melhores do período pela Academia Brasileira de Letras (então presidida por Nélida Piñon) e em comemoração aos 100 anos da instituição, incluía-se a modinha Chão de estrelas, de Sílvio Caldas e Orestes Barbosa, consagrando assim um gênero mais de duas vezes centenário. Mozart de Araújo, numa obra clássica sobre o tema 5, termina o estudo com as seguintes palavras: “Dizem que a modinha morreu. Ela não morrerá porque já não é mais uma canção, mas um estado de alma. Ela está na própria essência emotiva da nacionalidade.”
Ricardo Cravo Albin
Presidente do
Instituto Cravo Albin
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