O título aí acima pode parecer algo referente a Buster Keaton, o cineasta dos anos 20 que mesclava – com paixão e gênio – o riso à melancolia. Esta lembrança me remete ao cinema não sem razão: afinal, numa única semana acabam de desaparecer dois ícones da sétima arte, Bergman e Antonioni.
Riso e Melancolia, contudo, é o livro recém-lançado de Sérgio Paulo Rouanet. Sobre seu novo trabalho ensaístico, o embaixador e acadêmico me concedeu entrevista (no ar amanhã, às 23h30, pela Rede Vida, canal 26 da NET), em que perfila tanto o livro quanto um pouco de sua longa vida de pensador, polemista e filósofo.
E que polemista mais estimulante, embora sofisticado, é o Rouanet!
O pensamento filosófico no Brasil, quase sempre simplório, por vezes até tosco dentro de padrões internacionais, foi fecundado por ele desde os 20 anos de idade.
Ao lado de José Guilherme Merquior, meu colega de bancos escolares e luminar de nossa geração, Rouanet disparava polêmicas em artigos e ensaios nos espaços literários que os jornais do Rio nos anos 60 abriam com generosidade. Tempos em que Reynaldo Jardim pairava soberano, insuflando a ousadia e propulsionando jovens talentos que se iniciavam.
Rouanet declarou na entrevista que o primeiro dever do intelectual é com a verdade e jamais com a circunstância, ou com a política partidária. E denuncia o silêncio dos pensadores do país com relação à quebra sistemática da ética dos políticos, além da veiculação quase despudorada de mentiras e de meias-verdades, tão ao gosto doa administradores de hoje.
Valorizado por um denso estudo introdutório do também acadêmico Eduardo Portella, Riso e Melancolia propõe um mergulho originalíssimo por dentro de uma das jóias da literatura brasileira, Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Livro escrito, segundo o fundador da Academia Brasileira de Letras, com a pena da galhofa e a tinta da melancolia e que, em vez de começar seu relato com o nascimento, começa com a morte. Adentrando na análise da forma e não do conteúdo da obra-prima de Machado, o novo livro de Sérgio Paulo Rouanet deverá ser editado além fronteira, e certamente vertido para outras línguas.
Afinal, o fôlego de Riso e Melancolia conquistará os círculos acadêmicos mundiais, onde nosso Machado é estrela de primeira linha.
Ricardo Cravo Albin
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