Quem acompanha com atenção os núcleos estruturais de algumas famílias de artistas usa quase sempre o velho lugar-comum “quem puxa aos seus não degenera”. O que é uma verdade desde sempre. A sedução provocada pela elasticidade da música popular brasileira agasalha gerações de mesma origem que estão fixadas nas mentes, corações… e gargantas da nação. Como não se encantar com a carga genética de beleza que os Caymmi ou os Buarque, ou os Monarco da Portela (os Diniz), ou os Gonzaga, legaram a MPB? E que também irrigariam suntuosamente o canto popular.
Há pouco tempo ouvi Carlinhos Lyra e Kay, sua única filha, cantarem e se divertirem juntos em uma reunião de amigos. A graça e a leveza da cumplicidade entre ambos exaltavam a solidez do talento de pai e filha. Como se um fiapo seqüencial de perpetuação unisse ambos. Refiro-me especificamente aos Lyra porque Carlos e Kay, acompanhados por um dos mais referenciados músicos de nossa atualidade, o Maurício Maestro, também violonista e arranjador de mão-cheia, exibem-se no Teatro da Academia Brasileira de Letras nesta quarta-feira.
Carlinhos, que conheço desde 1960, ao desabrochar da Bossa Nova e no verdor de sua juventude, é criador de canções grampeadas na nossa memória coletiva. Vinicius me apresentou a ele com uma frase definidora: “depois do Tom, só mesmo Carlinhos para bem manusear minhas letras.”
Passadas tantas décadas, não estaria longe da verdade se o pai de Kay – agora também cantora de sucesso em Nova York – bradisse carinhosamente uma exclamação possível: “depois de tantos interpretes, só mesmo Kay para bem manusear o canto de minhas musicas.”
A lira dos Lyra será dedilhada nesta quarta, em momento significativo. Ou seja, a incessante dinâmica da Academia Brasileira de Letras assesta sua visão cultural para celebrar os 450 anos do Rio. Com a consciência de homenagear os fundamentos da Bossa Nova, movimento que deu parto à modernidade da canção do Brasil a partir de 1958.
12 de junho de 2015
Ricardo Cravo Albin
Presidente do Instituto
Cultural Cravo Albin