Há eventos e eventos. A maioria, reconheço, banais e repetitivos. Acabo de chegar das cidades de Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), que se faceiam separadas apenas pelo Velho Chico, o rio da integração e da grandeza. E justo ali assisti – embevecido – ao II Festival Internacional da Sanfona: um surpreendente encontro entre sanfoneiros de todo o mundo, a partir da magia primicial do trio sanfona, zabumba e triângulo. Terno que é, como deveríamos todos saber, a base da música vital do Nordeste deste país.
Ao Festival acudi meio descrédulo, pensando (antes de desembarcar) em evento paroquiano. No que fui surpreendido pela magnitude dos espetáculos, tanto pela energia que fluía e da interação palco-platéia, quanto pela dimensão abissal de músicos do porte de Dominguinhos (o grande homenageado do ano), Targino Gondim, Borghettinho e, especialmente, Mestre Camarão, com seus quase 80 anos aureolados por uma comovente consagração popular – inédita para nossos ouvidos pretensiosos do Sudeste. Este sim, confirmo agora, por vezes paroquiano ante a grandeza dos artistas que lá aplaudi.
O II Festival Internacional da Sanfona, belamente dirigido por Celso de Carvalho, foi patrocinado em sua parte mais substancial pelo Ministério da Cultura. Que assim acabou por prestar serviço inestimável ao levantamento memorial das fontes musicais do país. Além de provocar o levantamento da auto-estima do povo, dos músicos e de todos que por lá gravitamos em quatro dias plenos de beleza. Do Nordeste apenas? Certamente que não, porque de Juazeiro (terra do indispensável João Gilberto, príncipe da bossa nova) voltei retemperado. E confiando cada vez mais na música deste país generoso e, por que não? simplificado, ante à grandeza de uma arte popular não necessariamente metida à besta.
Ricardo Cravo Albin
Jornalista e escritor
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