Hoje, os amigos e devotos de Paulo Moura estão rezando pelo sétimo dia de sua morte.
Pixinguinha me confidenciou, numa tarde de muito uísque no bar Gouveia, que “estava botando olho nesse menino Paulo Moura, em quem ando apostando que pode chegar lá”. O “lá” de Pixinguinha significava a glória de poder tocar a música popular do choro cercado sempre pelos melhores instrumentistas do país e ser considerado um músico semiclássico, graças à maestria da execução.
Paulo Moura honrou, nesses últimos anos, a previsão do Mestre. E até mais porque, começando por onde os outros terminaram (como solista da orquestra do Teatro Municipal), Paulo pôde logo mostrar toda sua técnica e virtuosismo pelos quatro cantos do mundo. Foi não apenas um dos melhores músicos
do país, mas também do mundo inteiro.
Glória para o Brasil? Sim, por extensão. Mas glória mesmo para os esforços do rapaz, pobre e negro, que conseguiu persistir. E resistir aos apelos do fácil apenas por uns trocados a mais.
Lembro-me de que em 1988 assisti a uma récita da Orquestra Sinfônica de Brasília executando um dos seus trabalhos (nos 100 anos da libertação dos escravos), que ele próprio regeu. Ao meu lado, ouvi algumas embaixatrizes européias comentarem, desmanchando-se em elogios, sobre o porte do maestro, aquele homenzarrão de fraque e cabelos esvoaçantes, de cuja batuta fluía a alegria da música: “Mas até que parece o Von Karajan do Brasil”.
Acertaram na mosca. Ali estava um grande maestro, sim, na raça, na veemência e, mais que tudo, na alegria que brota do fundo d’alma quando as percussões tocam o ritmo endiabrado. E as cordas tangem a essência do choro mulato do Rio de Janeiro.
Ricardo Cravo Albin Jornalista e escritor www.institutocravoalbin.com.br