“Há duas espécies de silêncio. O sepulcral, dos cemitérios. E o ensurdecedor, dos políticos.” Jurista Hermes Lima, premier do parlamentarismo.
Esperei até as 23 horas desta segunda feira, dia 31, para escrever sobre o pronunciamento de Bolsonaro na disputa às eleições – de que ele obteve quase o mesmo número de votos que o vencedor Lula. Debalde. Até agora um dos silêncios mais barulhentos de que se tem notícia na atualidade brasileira.
Seria de fato tão necessário que Bolsonaro se manifestasse? Como diria meu professor e paraninfo de minha turma da Faculdade Nacional de Direito de 1963, o jurista Hermes Lima, depois Ministro do Supremo e premier: Seria mais, ou seria menos. O mais por conta de sua opinião ser esperada pelo país, já que foi disputante de uma única vaga. O que o levaria a um comportamento com duas reflexões. A primeira, atentem, a da gentileza, se não com o concorrente, o que seria desejável entre adultos civilizados, pelo menos com as milhões de pessoas que derramaram vários caminhões de votos nas duas cabeças disputantes da presidência.
A segunda razão, a mais óbvia: a um Presidente da República é obrigatória a força do rito, dos costumes políticos, da boa temperança, do controle rigoroso de dissabores e maus humores.
Ah, dir-se-ia, mas o Presidente sempre foi assim, só procede motivado pelo que lhe passa pela cabeça. Sim, não há como negar que em momentos decisivos de se fecharem cortinas o pano tem que encobrir todo o palco. Afinal é o Gran Finale, é a necessária exceção da regra.
De mais a mais, a palavra de Bolsonaro reconfirmaria aquilo que ele negara anteriormente, a virtude das urnas eletrônicas a que ele próprio se submetera. E fora por elas muito bem aquinhoado, elegendo espetacularmente o poderoso governador de São Paulo.
Já com o calor dos debates se arrefecendo, urnas apuradas sem contestação, Lula prestes a armar seu Governo de Transição, não há como fechar os olhos e não confirmar o baixo nível do debate final da sexta-feira, promovido com os cuidados especiais pela Rede Globo.
Seria impensável, ao menos para mim, que o debate em que os concorrentes se chamaram de minuto a minuto de mentirosos (o que horrorizou o país) não trouxesse sequelas.
A Lula se encarece descer logo do palanque para pacificar o país com palavras e atos – muitos, mas muitos mesmo, sem quaisquer economias.
Como de resto acaba de proceder, o ministro Moraes do Supremo Tribunal Eleitoral, determinando a abertura imediata das estradas por caminhoneiros bolsonaristas descontentes com o resultado das urnas.
Aliás, a dureza das medidas de Moraes recebeu não só aclamação geral, como fez cessar a ilegalidade de paralisar o país por mero descontentamento político.
De fato, muitos são os desafios que se põem agora à nossa frente – a economia exibe sinais de desaceleração, os juros estão altos demais para conter a inflação, e o desequilíbrio do orçamento está mascarado pela arrecadação. Tudo fará exigir de Lula forças hercúleas para resgatar a credibilidade fiscal.
Isso, fora os demais mil e um itens a serem resolvidos, como educação, comida a quem tem fome, saúde mais ágil e eficaz para todos, em especial os eternos deserdados pela pobreza.
Volto ao pensamento do jurista e grande pensador Hermes Lima, que trovejava em pleno Salão Nobre da antiga Faculdade Nacional de Direito (onde em décadas anteriores o antigo Senado ajudou a forjar nossa nacionalidade) um quase grito de guerra – “prestem atenção, toda atenção, seus tolos, não sejam incendiários, porque o maior, o único eu diria, desafio de uma campanha eleitoral violenta é abrir caminhos ao diálogo.
Só o diálogo, tão difícil para o ardor de vozes jovens como vocês, será possível”.
Ou seja, o diálogo requer também a paciência. Ou antes, exige!
Ricardo Cravo Albin