Por razões opostas, duas amigas queridas que viveram intensa participação acadêmico-cultural serão reverenciadas hoje neste texto.
Heloísa Lustosa nos deixou há dias em Belo Horizonte, silenciosa e discretamente como viveu, uma vida em que esgrimiu elegância e suavidade de gestos e de comportamento, desde o rosário de lágrimas que foi acompanhar o trágico incêndio do Museu de Arte Moderna que comandava como diretora, até a sua hoje inesquecível participação como Presidente da Academia Brasileira de Artes. Acompanhei-a, como dos mais antigos integrantes da ABA, em dezenas de reuniões, posses e celebrações, sempre generosa e constantemente auxiliada pelo nosso Secretário Geral da Academia, o historiador Victorino Chermont de Miranda, atual presidente do IHGB – o credibilizado Instituto Histórico e Geográfico do Brasil.
A posteridade, que chegou para Heloísa por motivo inevitável, apontou mais uma vez nesta segunda-feira para Nélida Piñon, por motivo oposto – a vida, por conta de uma raríssima homenagem que o governo de Espanha acaba de lhe prestar. O acadêmico espanhol Antonio Maura inaugurou no Instituto Cervantes, órgão internacional de difusão da cultura hispânica, a Biblioteca-Museu Nélida Piñon, absorvendo todo o portentoso acervo de quase 10 mil livros dados pela celebrada escritora, filha e neta de catalães, além de aplicada autora e estudiosa dessas fontes paternas tão estimulantes, quase sempre presentes na essência dos livros de Nélida.
O Embaixador de Espanha, o principal anfitrião do ato, anunciou que chegou a pedir a seu governo a nacionalidade espanhola para a brasileira, a única mulher a presidir a Casa de Machado de Assis, exatamente no seu centenário, celebração mais destacada nessas atuais décadas. A propósito, Nélida seria empossada por Heloísa na ABA há menos que um ano como acadêmica. E sempre à Academia de Artes Nélida se referia com muito orgulho e cordialidade. Heloísa chegou a me confidenciar que a entrada de Nélida na ABA teria sido uma de suas maiores alegrias nesses últimos tempos tempestuosos. Nossa Helô se empenhou sempre no amor ao Brasil, filha que era do Vice-Presidente Pedro Aleixo e irmã de um virtuoso sacerdote católico, o meu estimado Padre Aleixo.
Pois bem, essas razões todas se entrecruzaram na última quinzena para estar eu neste espaço a desferir agora dardos de estima e admiração para duas grandes mulheres, que sempre amei por mais de cinquenta anos a fio.
Nélida, aliás, comoveu a todos ontem com a grandeza que somente as coisas que brotam do coração podem irradiar. A nova Biblioteca-Museu Nélida Piñon é sua atual morada, disso todos os muitos intelectuais presentes estavam conscientes. Conviver com a intimidade de uma das mais estimadas personalidades literárias neste país agora está ao alcance das mãos de qualquer um.
Atentem para uma das muitas frases definidoras que colhi na Biblioteca para essa convivência íntima com Nélida Piñon a partir de sua nova casa:
“Uma cultura só se impõe quando ela se impõe por si mesma. E aí é legítimo propô-la e amá-la. E a aceitação dependerá de que a proposta resulte em algo satisfatório.”
O novo e exclusivo endereço de Nélida para abrigar todos os que a amam é o que se segue: Rua Visconde de Ouro Preto, 62 – Botafogo – Instituto Cervantes.
Ricardo Cravo Albin
1- Está praticamente pronto o talvez mais original produto feito para celebrar os 200 anos da Independência do Brasil. O Livro + CD do Instituto Cravo Albin, da FAPERJ e do Estado do Rio de Janeiro com retratos originais de Pedro I escritos pelos maiores historiadores do país, curatelados por Mary Del Priore. E o fundamental: a revelação do Emancipador do Brasil como compositor erudito de missas, credos e hinos patrióticos em todo um CD inédito.
2- O Livro + CD será lançado com missa solene para celebrar o “Independência ou Morte” de 7 de setembro de 1822 no Teatro Municipal, a que se seguirá o lançamento público do produto cultural, a ser distribuído para as embaixadas do país no exterior.
3- O Pen Clube do Brasil, honrando os 200 anos da nossa Independência, resolveu que o Grande Prêmio Pen Clube, uma tradição literária desde 1936, será dedicado este ano aos escritores que se debrucem sobre livros e ensaios da História do Brasil. A primeira inscrita foi a historiadora Mary Del Priore, candidata a substituir a homenageada de 2021, Nélida Piñon.
Na foto, da esquerda para a direita: Ricardo Cravo Albin, Nélida Piñon, Heloísa Lustosa e Victorino Chermont. Na posse de Nélida Piñon na ABA.